sexta-feira, 3 de junho de 2016

O Outono do Patriarca

" Eram eles que escreviam as ordens que me faziam assinar; eles aveadaram os artistas; trouxeram a bíblia e a sífilis, faziam a gente acreditar, que a vida era fácil, mãe...Que tudo se consegue com dinheiro...Que os negros são contagiosos.Que a nação é um negócio...E que o sentimento de amor à Pátria, não passa de uma sacanagem inventada pelo exército para que as tropas lutassem grátis".

Talvez tenha uma ou outra palavra errada...Faz tempo que li. Acho que tinha uns dezoito anos..Há tempos, um bom tempo!!! Conheci Gabo quando ainda era uma menina e me perdi com as borboletas amarelas de Maurício Babilônia!! Depois, vieram O Enterro do Diabo, O Funeral da Mamãe Grande, Crônica de Uma Morte Anunciada, Ninguém Escreve ao Coronel, Olhos de Cão Azul, Cheiro de Goiaba, A Incrível e Triste História de Cândida Erêndira e Sua Avó Desalmada...Relato de Um Náufrago, O Amor nos Tempos do Cólera, Do Amor e Outros Demônios...Faz tempo, a memória me trai.



O inesquecível Outono do Patriarca, publicado pela primeira vez em 1975...Acho que temos muito em comum..Sou de Áries, o signo da Solidão, Ninguém nos quer - como dizia Gabo. E o realismo mágico das formigas vermelhas cedia espaço para um romance histórico. A solidão de um ditador na América Latina. Um complexo de interesses econômicos, políticos e sociais representado pela frágil ditadura da América Menina. Um homem só, com uma patente e uma solidão que o seguiu até a morte. Tudo contado obedecendo o domínio cronológico das tramas de García. Li duas vezes. assim como fiz com os outros. Exceto Cem Anos de Solidão, que li umas cinco...Rsrsrsrs. É que não dá pra se contentar com pouco.



Gabriel Garcia Márquez, nobel de Literatura em 1982



E ele nos apresenta um leque de possibilidades de reinterpretar os fatos políticos que abalaram vários países do continente americano na segunda metade do século XX. El Otoño Del Patriarca nos estabelece uma relação estreita entre a ficção e a história. Constrói assim uma crítica severa ao regime do seu tempo e ao tempo em que ele próprio está condicionado, isto é, a ditadura latino-americana. A narrativa abordava a vida do patriarca em sua esfera familiar, afetiva e privada. O que viria a ser o tirano, antes de chegar a exercer poderes quase que ilimitados, era um homem tão ou quase tão infeliz quanto os outros. E quando próximo do seu fim, ele passa a questionar-se sobre o poder e quem realmente era detentor do mesmo, já que houve um momento em que não se sabia quem mandava e quem obedecia. já que "habia ilegado sin assombro a la ficcion de ignominia de mandar sem poder, de ser exaltado sin gloria y de de ser obedecido sin autoridade" (MÁRQUEZ, 1999, págs. 295-296). 

Percebo que a visão do escritor se confunde por vezes, com e visão do jornalista, assim como a intensa cabeleira cobre de Sierva Maria de todos Angeles, os transtornos das visões de Úrsula Buendía, a resistência de Rebeca De Montiel e os preconceitos de Fernanda Del Carpio, convivem a um só tempo com a dominação das companhias inglesas e do capital norte-americano. E as ditaduras do nosso tempo em pouco difere das ditaduras expostas por Gabo, Eduardo Galeano e Isabel Allende. A miséria, as filas de desempregados, a violência exposta nas praças da Venezuela, as mazelas da Colômbia, a quase nulidade do Uruguai. De nossas veias ainda abertas escoam o suor e o sangue de nossa gente. Na verdade, na nova ordem, o nosso vizinho é a Rússia...E o Brasil às margens do processo democrático que nos libertou, agoniza; e, por pouco não dissolveu  a nossa República.

Foi essa indignação que me fez voltar a escrever. A corrupção que nos assola, a impunidade de quem comete e de quem oculta os crimes, que por vezes nos aprisionam..

O valor dessa gente não cabe e nem merece um poema, porque a rima seria uma ausente e não há métrica que entoe toda essa zona.  





E o Grande General para o seu labirinto me convida, uma companhia que não é só das bananeiras...É do ruibarbo, do suor delirante de Nigromanta...Das incontáveis formigas vermelhas. Num universo vasto, envolto num real mistério, o mistério da cidade dos espelhos - ou das miragens???- porque o oceano de Gabo se perde como o Relato de um Náufrago.

E um viva para os olhos do cão azul.
A gente se encontra!.